terça-feira, 26 de março de 2013

Apesar de desvantagens, escola da zona rural supera nota de `colégios ricos'

Apesar de desvantagens, escola da zona rural supera nota de `colégios ricos`
DANIELA ARAI - FOLHA DE SÃO PAULO - 26/03/2013 - SÃO PAULO, SP
Todas as manhãs, os alunos da escola Sebastião Duarte Filho, na zona rural de Pedra Branca, sertão do Ceará, tomam o pau-de-arara e viajam quilômetros para fazer o que seus pais não tiveram oportunidade: estudar.
No mesmo horário, alunos do Colégio Municipal Tom Jobim, em Santana de Parnaíba, região metropolitana de São Paulo, deixam condomínios da região de Alphaville em carros ou vans para ir à escola, trilhando caminho já conhecido pelos pais.
Apesar das desvantagens, a escola cearense obteve classificação no último Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) superior à do colégio paulista, alcançando a nota mais alta no nono ano (5,6) entre os colégios com alunos de nível socioeconômico `mais baixo`.
Do outro lado, o Tom Jobim aparece como a escola de nível socioeconômico `mais alto` que registrou a nota mais baixa no índice (5,0) em 2011.
A classificação das escolas do Brasil em sete estratos, segundo renda, escolaridade e ocupação dos pais, foi feita pelos professores Francisco Soares e Teresa Alves, da Universidade Federal de Minas Gerais, a partir de questionários socioeconômicos da Prova Brasil e do Enem.
Soares diz que as instituições devem ser vistas por meio de seu `valor agregado`: o número de pontos na nota do aluno que pode ser atribuído a práticas pedagógicas e de gestão.
Segundo ele, essa medida frequentemente mostra que muitas escolas têm desempenho alto apenas pelo fato de contarem com alunos de nível socioeconômico mais elevado, condição que proporciona maior capital cultural.
O colégio Tom Jobim tem o oitavo NSE (medida de nível socioeconômico) mais alto entre 64 mil escolas públicas, só superado por alguns colégios militares.
`Com alunos tão selecionados o resultado da escola em termos de valor agregado é pífio`, afirma Soares.
Nada comparável ao `efeito` da escola do Ceará, que elevou filhos de agricultores não escolarizados à 12ª colocação na classificação geral do Ideb nos anos iniciais do ensino fundamental.
`Essa escola está levando os alunos três anos adiante`, afirma o professor.
Para Maria do Carmo Mendes, secretária de Educação de Pedra Branca, que tem um Ideb de 4,9 nos anos finais do ensino fundamental (contra 4,2 de Santana do Parnaíba), o que explica os bons resultados da escola e da rede são `bons gestores, bons professores e um bom envolvimento com a família.`
Maria Duarte, diretora da escola, concorda. `A gente conhece todas as famílias. Se o aluno falta dois dias seguidos, já fazemos uma visita.`
No Tom Jobim, que recebe alunos egressos de colégios particulares, a relação com as famílias é mais distante.
`Nessa comunidade, os limites são muito tênues. Lidar com esse pessoal de poder aquisitivo maior é difícil`, diz Tânia Cardamone, ex-supervisora pedagógica da escola.
Adilson da Silva, professor de matemática do Tom Jobim, afirma que a relação com os pais é tensa. `Eles não aceitam que o filho não tire boas notas. Acham que, por ser uma escola municipal, deveria ser mais fácil.`
Em nota, a Secretaria da Educação de Santana de Parnaíba afirmou que o Tom Jobim `atende uma clientela de melhor nível socioeconômico, cujos interesses extrapolam os muros do colégio`.
Defendeu ainda que é necessário considerar outras variáveis na avaliação do desempenho, como a população da cidade e o tamanho da rede educacional, e disse que é importante aprender com a experiência de Pedra Branca.